Sinopse:
Nas frigidas madrugadas, em uma angustiante cidade do Centro-Oeste, centenas de pessoas desempregadas estão na fila para uma vaga numa feira de empregos. Sem qualquer aviso um motorista solitário irrompe no meio da multidão em um Mercedes roubado, atropelando os inocentes, dando ré e voltando a atropelá-los. Oito pessoas são mortas, quinze feridos.
Opinião:
Será que o homem nasce essencialmente bom e sua inocência é corrompida pela maldade do ambiente em que cresce? Ou mal é uma mancha inerente da alma humana, cujo florescer está predestinado desde as primeiras lágrimas do bebê? Ao longo dos séculos a natureza humana é fonte de debates calorosos, alimentados diariamente pelas tragédias expostas pela mídia, notícias de jovens que invadem escolas e deixam uma trilha de cadáveres ou explodem em centros populacionais estão cada vez mais regulares. Hoje em dia o grande bicho-papão que jaz nas sombras da imaginação humana não é mais um ser sobrenatural, mas sim sua própria imagem, quando o homem olha para a escuridão descobre estar defronte a um espelho. Stephen King, em Mr. Mercedes, disseca a mente de um desses predadores, explorando os caminhos corroídos pela loucura e mergulhando no cerne sombrio da insanidade que justifica tais atos abomináveis, o Assassino do Mercedes é um dos seus melhores vilões humanos.
Mr. Mercedes é o primeiro livro da trilogia policial protagonizada pelo detetive aposentado Bill Hodges, constituída também por Achados e Perdidos e O Último Turno, uma grande homenagem ao gênero do suspense e às clássicas histórias de detetive, fundamentada numa releitura moderna de vários clichês embalados na austeridade sombria que permeia os romances americanos pós 11 de Setembro. É o livro mais "Dean Koontz" que King já escreveu, Koontz é famoso atualmente por ter encontrado a fórmula perfeita para seus thrillers de mistério, na qual o protagonista corre contra o tempo, perseguido por um psicopata violento, para impedir uma grande catástrofe iminente. King sorrateiramente percorre os mesmos caminhos que vários autores famosos já trilharam, a exemplo de Raymond Chandler, Donald Westlake e Jim Thompson, seu diferencial está na habilidade de costurar clichês em um cenário moderno fazendo com que o leitor sinta-se inserido no contexto de sua narrativa. Para a obra de Stephen King, Mr. Mercedes é um revigorante mergulho em um gênero pouco explorado pelo autor, e para o leitor uma deliciosa viagem por caminhos ainda não desbravados do universo "kinginiano".
Bill Hodges é um detetive policial aposentado, seus dias de descanso são assombrados pelo fantasma do único caso que não conseguiu resolver na ativa, o do Assassino do Mercedes, um maníaco que atropelou uma multidão que se aglomerava na entrada de uma feira de empregos. Hodges recebe uma carta extremamente provocante do assassino e isso é o estopim para o início de uma nova investigação, desta vez sem as amarras da lei, que o levará a uma conclusão sangrenta. O protagonista de King é bem interessante, um detetive aposentado que reconhece suas próprias limitações, grande parte dos embates com o antagonista são psicológicos, mas o destaque, como sempre, é o vilão. Mr. Mercedes é o tipo de monstro que vive camuflado na sociedade, usando pele humana, sua personalidade é uma mescla entre o lado charmoso de Ted Bundy e a fixação doentia de Norman Bates, construída através de situações no presente, que exemplificam o que ele é, e flashbacks que mostram como ele se tornou o que é. Com uma escrita rápida e ágil King mantem o suspense de forma constante na narrativa, as últimas cem páginas são a explosão da tensão acumulada ao longo da história e prendem o leitor até o final, é impossível parar a leitura até chegar às últimas linhas e mesmo assim a ansiedade se volta para os próximos volumes. Mr. Mercedes é um ótimo ponto de partida para uma trilogia que tem tudo para ser fantástica.
Nota: ☠☠☠☠☠☠☠☠☠☠ (10/10 Caveiras)